Nenhuma declaração é mais difícil de entender ou amedrontadora do que a de Mateus 19.29: "E todo aquele que tiver deixado casas, ou irmãos, ou irmãs, ou pai, ou mãe (ou mulher), ou filhos, ou campos, por causa do meu nome, receberá muitas vezes mais, e herdará a vida eterna."
A parte sobre deixar casas e propriedades posso compreender. Ê a outra parte que me faz estremecer. A parte sobre deixar pai e mãe, dizer adeus aos irmãos e irmãs, dar um beijo de despedida num filho ou filha. É fácil comparar o discipulado com a pobreza ou a desgraça pública, mas deixar minha família? Por que devo estar disposto a deixar meus entes queridos? Pode o sacrifício ficar ainda mais sacrificial do que isso?"
"Mulher, eis aí o teu filho."
Maria está mais velha agora. O cabelo nas têmpo¬ras ficou grisalho. As rugas substituíram sua pele jovem. Tem as mãos calosas. Ela criou vários filhos e agora contempla a crucificação do primogênito.
Ficamos pensando quais as lembranças que lhe passam pela mente enquanto testemunha a tortura dele. A longa viagem para Belém, talvez. Uma cami¬nha de bebê feita de palha. Fugitivos no Egito. Em casa em Nazaré. Pânico em Jerusalém. "Pensei que estava em sua companhia!" Lições de carpintaria. Riso à mesa do jantar.
E aquela manhã que Jesus chegou cedo da oficina, seus olhos mais firmes, sua voz mais direta. Ele ouvira as notícias. "João está pregando no deserto." Seu filho tirou o avental, limpou as mãos e com um último olhar despediu-se da mãe. Ambos sabiam que nada mais seria igual de novo. Naquele último olhar eles compartilharam um segredo, cuja extensão era dema¬siado penosa para ser repetida em voz alta.
Maria aprendeu naquele dia que o sofrimento vem com a despedida. A partir daquele momento teria de amar o filho à distância; na periferia da multidão, do lado de fora de uma casa cheia, na praia do mar. Talvez ela até estivesse lá quando foi feita a promessa enigmática: "E todo aquele que tiver deixado... mãe... por causa do meu nome."
Maria não foi a primeira a ser chamada para despedir-se de seus entes queridos por causa do reino. José foi chamado para ser órfão no Egito. Jonas para ser um estrangeiro em Nínive. Ana levou seu primo¬gênito para servir no templo. Daniel foi enviado de Jerusalém para a Babilônia. Neemias de Susã para Jerusalém. Abraão recebeu ordem para sacrificar seu próprio filho. Paulo teve de despedir-se da sua heran¬ça. A Bíblia está unida por trilhas de adeuses e manchada por lágrimas de despedida.
De fato, parece que adeus é uma palavra que prevalece no vocabulário cristão. Os missionários a conhecem muito bem. Os que os enviam também a conhecem de sobra. O médico que deixa a cidade para trabalhar no hospital na selva já pronunciou essa palavra. O mesmo acontece com o tradutor da Bíblia que mora longe de casa. Os que alimentam os famin¬tos, os que ensinam os perdidos, os que ajudam os pobres, todos eles conhecem o termo "adeus".
Aeroportos. Bagagem. Abraços. Luzes de ré su¬mindo na distância. "Diga até logo para a vovó." Lágrimas. Estações rodoviárias. Cais marítimos. "Adeus, papai." Gargantas contraídas. Balcões de passagens. Olhos molhados. "Escreva!"
Pergunta: Que tipo de Deus colocaria as pessoas em tal agonia? Que tipo de Deus lhes daria famílias e depois pediria que as deixasse? Que tipo de Deus lhes daria amigos e depois pediria que lhes dissesse adeus?
Resposta: Um Deus que sabe que o amor mais profundo não é construído sobre a paixão e o romance, mas sobre uma missão e um sacrifício comuns.
Resposta: Um Deus que sabe que somos apenas peregrinos e que a eternidade está bem perto e que qualquer "Adeus" é na verdade um "Te vejo ama¬nhã".
Resposta: Um Deus que também fez isso.
"Mulher, eis aí o teu filho."
João abraçou Maria um pouco mais apertado. Jesus estava pedindo que fosse o filho que uma mãe precisa e que de certa forma ele não fora.
Jesus olhou para Maria. Sua dor tinha uma origem muito mais profunda que os pregos e espinhos. Em seu olhar silencioso eles trocaram de novo um segredo e ele disse adeus.
(Atos 20.35/ Lucas 9.24./ Mateus 13.57.)
Excluído do Livro - Seu nome é Salvador de Max Lucado
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